RIO - Transformada num grande canteiro de obras, a Zona Portuária do
Rio se tornou um valioso campo de arqueologia urbana. Desde janeiro de
2011, pelo menos quatro equipes de especialistas vêm percorrendo cerca
de 5 milhões de metros quadrados, num trabalho de garimpagem que precede
as construções do projeto Porto Maravilha, de revitalização e
remodelação. Até agora foram recolhidos — ou apenas registrados —
pedaços de cerâmica, cachimbo, ossos de animais, moedas, pulseiras,
colares, resquícios de muralhas e outros vestígios que revelam um pouco
da história da ocupação da cidade nos séculos XVIII e XIX. Só de
canhões, já foram contabilizados sete. Uma lista que, segundo o último
levantamento, totaliza 80 mil peças, somente na área que está sendo
pesquisada pela equipe do Consórcio Porto Novo, responsável pelas
escavações na maior parte da região.
—
É como montar um quebra-cabeças de milhares de peças que, aos poucos,
vai revelando cenas, construções e costumes de diferentes épocas do
passado do Rio. A partir do que estamos encontrando por aqui, diversas
linhas de pesquisa vão aparecer para tentar contar um pouco da história
da cidade nos últimos 500 anos — explica Erika Gonzales, chefe do
programa de arqueologia do Consórcio Porto Novo.
O trabalho de
arqueologia para monitoramento do solo da região foi divido em duas
fases e está sendo realizado por equipes diferentes. Na primeira, que
integra o pacote de obras de infraestrutura feito pela Secretaria
municipal de Obras, o grupo é chefiado pela doutora Tânia Andrade Lima,
coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Arqueologia da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Esta fase, iniciada em janeiro de
2011 e prevista para acabar até junho, compreendeu 27 vias, em cinco
quarteirões, que incluíram as ruas Barão de Tefé, parte da Sacadura
Cabral e a Avenida Venezuela, além do Morro da Conceição e a Avenida
Rodrigues Alves. Na fase dois, as sondagens arqueológicas começaram há
sete meses, coordenadas pela equipe de Erika, contratada pelo Consórcio
Porto, a quem caberá a missão de vasculhar, pelos próximos quatro anos,
57 quilômetros de vias que não serão pesquisados pelo grupo da
professora Tânia. Todo o trabalho arqueológico está sob a supervisionado
pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
Os
últimos achados foram dois canhões, resgatados do subsolo da Praça Mauá
e da altura da Avenida Primeiro de Março, na semana retrasada.
Artilharia, que, pelos cálculos dos arqueólogos, parece datar dos
séculos XVIII e XIX, e mede entre 2 e 4 metros. Lá também foram
descobertas, em abril, três âncoras medindo entre 3,5 metros e 4,35
metros que estavam no subsolo da região e, de acordo com as primeiras
avaliações, datam da mesma época dos canhões. Naquelas áreas também foi
desenterrada, no dia 4 de maio, a pedra fundamental das Docas Dom Pedro
II, lavrada em 15 de setembro de 1871 pelo engenheiro André Rebouças. As
âncoras, os canhões e três balas de canhão, foram os objetos mais
significativos recolhidos até o momento, na avaliação de Erika Gonzales.
O
material, que está sendo classificado e pesquisado no Laboratório de
Antropologia Biológica da Uerj, traz objetos que impressionam pelo bom
estado de conservação, como um conjunto de três tinteiros ingleses de
cerâmica, retirados intactos, durante escavações nos arredores da Praça
Mauá. Num poço situado perto de um antigo arsenal da Marinha, as equipes
se depararam com uma garrafa em perfeito estado, que acreditam ser do
século XVIII. O acervo inclui, ainda, faianças inglesas do século XIX,
cabos de colher, restos de sola de sapato de couro e pedaços de dentes
de cavalos. Na Praça Mauá, foram prospectados principalmente peças do
século XIX. Já na Primeiro de Março, alguns objetos do final do século
XVIII. Nas proximidades da Avenida Primeiro de Março, esquina com a rua
Visconde de Inhaúma, surgiu uma muralha de 50 metros de extensão,
pertencente a uma artilharia da Marinha. Um outro pedaço de muralha foi
desvendado mês passado. Segundo a prefeitura, até agora as escavações
não provocaram atrasos nas obras do Porto Maravilha.
Os
arqueólogos da Concessionária Porto Novo estão catalogando as peças e
vão lançar em breve um museu virtual, onde o internauta poderá ver fotos
e vídeos, além de um arqueoparque, que vai reproduzir em 3D alguns dos
prédios e ruas dos séculos XVIII e XIX.
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