quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Tradição maia se populariza, mas descendentes estão esquecidos

Nesta sexta, descendentes de maias celebram do 13º B'aktun.
Indígenas da Guatemala não recebem assistência do governo.

Do Globo Natureza, em São Paulo*

Centro arqueológico Tikal, na Guatemala, que abriga resquícios da civilização maia na América Central (Foto: Hellen Santos) 
Centro arqueológico Tikal, na Guatemala, que abriga
resquícios da civilização maia na América Central
(Foto: Hellen Santos/Globo Natureza)
 
A tradição dos maias passou a ser mais divulgada e comentada nos últimos meses devido à celebração do 13° B'aktun, considerado o início de uma nova era prevista no calendário desta ancestral civilização. No entanto, indígenas da Guatemala, seus descendentes diretos, seguem esquecidos, excluídos e marginalizados.
No dia 21 de dezembro, quando conclui o período de 5.200 anos que os antigos maias determinaram como o início de uma nova era para a humanidade, as principais autoridades do país, lideradas pelo presidente Otto Pérez Molina, lembrarão a data em uma suntuosa cerimônia no centro arqueológico de Tikal.

Milhares de turistas estrangeiros, mais de 200 mil segundo os cálculos do Instituto Guatemalteco de Turismo, presenciarão os atos e as cerimônias religiosas, científicas, sociais e espirituais que foram programadas para a ocasião, nos 13 centros sagrados da cultura maia espalhados por todo o país.

Embora os sacerdotes, idosos e guias espirituais maias dirigirão as cerimônias religiosas e terão a seu cargo as atividades místicas e filosóficas que darão as boas-vindas ao Oxlajuj Ak'abal, o "novo amanhecer", os indígenas marginalizados, pobres e discriminados, não serão vistos nesses lugares.

Os mais de US$ 6 milhões que o governo guatemalteco destinou à celebração do 13° B'aktun foram investidos para atrair os turistas estrangeiros para as celebrações oficiais da data, mas não para motivar a participação dos seus descendentes diretos, que, segundo números oficiais, representam mais de 42% dos 14 milhões de habitantes do país centro-americano.

Ganhadora do Nobel da Paz de 1992, a guatemalteca Rigoberta Menchú vai participar do II Fórum Global de Sustentabilidade do SWU  (Foto: Dennis Barbosa/G1) 
Ganhadora do Nobel da Paz de 1992, a guatemalteca
Rigoberta Menchú lamenta que a celebração do B'aktun
tenha se 'desvirtuado' (Foto: Dennis Barbosa/G1)
 
A líder indígena Rigoberta Menchú, Prêmio Nobel da Paz 1992 e defensora dos direitos dos povos originais, lamentou na quarta -feira que as celebrações do 13° B'aktun tenham se "desvirtuado" do essencial, o humano e o espiritual.

Os milhões de indígenas que não foram convidados para festa, assinalou Menchú, celebrarão o 13° B'aktun "em silêncio" e "na intimidade" de sua espiritualidade, longe das luzes e as câmaras.


“Isto é propaganda de Hollywood. Eles gostam de ser dramáticos e vender mais filmes. O calendário maia é uma matemática do tempo, é filosófico e anuncia novas eras de vida, de construção, de equilíbrios”, disse na época.

O Conselho do Povo Maya de Occidente, que aglutina dezenas de organizações indígenas do país, 
qualificou em comunicado de "degradante" a forma como o governo e o setor empresarial "folclorizaram" e "mercantilizaram" a data, propiciando interpretações inadequadas da visão do mundo maia.

População esquecida
Essa visão foi tão dissipada que, em nível mundial, os maias estão na moda não pelos grandes avanços que fizeram em astronomia, medição de tempo e arquitetura, mas pelas errôneas e catastróficas interpretações que relacionam o B'aktun com o fim do mundo. Mas sobre as deploráveis condições de vida dos indígenas guatemaltecos se fala muito pouco dentro e fora do país, pelo menos durante estes dias.

O racismo e a discriminação que os descendentes maias sofrem, a pobreza que atinge mais de 73% deste povo, a falta de terras para cultivar alimentos e a escassez de serviços de saúde e educação não costumam ser tema de discussão no dominante grupo ladino, como são chamados os não indígenas.

Por mais de 15 anos, o Parlamento se negou a aprovar uma Lei de Lugares Sagrados dos Povos Indígenas, destinada a garantir o direito a usar, conservar e administrar os lugares do país que são considerados "sagrados" segundo sua espiritualidade.

Além disso, o Parlamento também vetou a Lei de Desenvolvimento Rural Integral, que permitiria que os milhões de indígenas e camponeses pobres e marginalizados superam as paupérrimas condições de vida em que se encontram. Talvez na nova era da humanidade, que segundo o calendário maia começa em 21 de dezembro, as coisas vão melhor para os descendentes guatemaltecos dessa ancestral cultura.

O guatemalteco Álvaro Pop, especialista independente do Fórum Permanente para as Questões Indígenas da ONU, acredita que o 13° B'aktun vai contribuir para introduzir os temas indígenas na agenda midiática, para que sejam ampliados os debates em torno de seus problemas e sejam buscadas soluções.

Por enquanto, o que se sabe é que o mundo poderá acompanhar ao vivo, da milenar cidade de Tikal, as celebrações oficiais do nascer do sol da nova era, que serão transmitidas pela televisão local com satélite aberto gratuito.


*Com informações da EFE
Mercado de Chichicastenango, na Guatemala, considerado o maior mercado indígena da América Central e que reúne descendentes dos maias (Foto: Hellen Santos/Globo Natureza) 
Mercado de Chichicastenango, na Guatemala, considerado o maior mercado indígena da América Central e que reúne descendentes dos maias (Foto: Hellen Santos/Globo Natureza)

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