(...) O terramoto teve início às 9 horas e 40 minutos do Dia de Todos os Santos, 1 de Novembro de 1755. A terra tremeu três vezes, num total de 17 minutos, e, durante vinte e quatro horas, a terra não deixou de estremecer.
O sismo teve o epicentro no mar, a oeste do estreito de Gibraltar, atingiu o grau 8,6 na escala de Richter e o abalo mais forte durou sete intermináveis minutos. Por ser Sábado, acorreram mais pessoas às preces. As igrejas tinham os devotos mais madrugadores. Só na igreja da Trindade estavam 400 pessoas. Se os abalos tivessem começado mais tarde, teria havido mais vítimas, pois os aristocratas e burgueses iam à missa das 11 horas. Depois dos abalos, começaram as derrocadas. O Tejo recuou e depois as ondas alterosas tudo destruíram a montante do Terreiro do Paço e não só. Era o fim do mundo!
Os incêndios lavraram por grande parte da cidade durante intermináveis dias. Foram dias de terror. As igrejas do Chiado e os conventos ficaram destruídas. A capital do império viu-se em ruínas, já para não falar de outras zonas do país, como o Algarve, muitíssimo atingida pelo sismo e maremotos subsequentes. Do Convento do Carmo, construído ao longo de mais de trinta anos e terminado, provavelmente, em 1422, com o empenho e verbas do Condestável Nuno Álvares Pereira, sobrou um amontoado de ruínas. A comunidade italiana que mandara construir a Igreja do Loreto viu cair o sino da torre, e, de seguida, o incêndio tudo consumiu. Ficaram os escombros. Quanto às igrejas da Trindade e do Sacramento desapareceram. «O Sacramento, das 17 freguesias que sobre a ruína do abalo sofreram o estrago do incêndio, foi das mais destroçadas nessas horas funestas.» Não foi poupado o antigo Convento do Espírito Santo, que haveria de transformar-se nos Armazéns do Chiado e Grandela. As ruínas do Convento do Espírito Santo foram depois compradas por um argentário, conhecido por Manuel dos Contos, mais tarde barão de Barcelinhos e depois visconde. A filha única casou com o 2º visconde de Ouguela, que foi proprietário do edifício até ao dia em que o vendeu para ser transformado nos hotéis Europa, Gibraltar, Universal, (tão falado em “Os Maias” de Eça de Queiroz) e Hotel dos Embaixadores, que já não existem. Sofreram um grande incêndio, em Setembro de 1880. Em 1894, os Armazéns do Chiado adquiriram a parte central. Outro incêndio, o de Agosto de 1988 destruiu por completo aquele espaço. Os mais cépticos não acreditaram que o Chiado renascesse, mas ficou provado que ele tem "artes mágicas" para reviver e atrair a si tudo e todos.
Na voragem do terramoto de 1755 desapareceram cinquenta e cinco palácios, mais de cinquenta conventos, a Biblioteca Real, vastíssima em livros e manuscritos e as livrarias (como sinónimo de bibliotecas) dos conventos de S. Francisco, Trindade e Boa Hora. As chamas reduziram a cinzas milhares de livros em cinco casas de mercadores de livros franceses, espanhóis e italianos, e em vinte e cinco – contadas por Frei Cláudio da Conceição – lojas e casas de livreiros. Salvou-se o precioso arquivo da Torre dos Tombo, devido aos cuidados do seu guarda-mor Manuel da Maia. Um jovem inglês de apelido Chase, que presenciou tudo, escreveu numa carta á família: «Porque o povo possuído da ideia de que era o Dia do Juízo, e querendo-se antes empregar em obras pias, tinha-se sobrecarregado de crucifixos e santos, e tanto os homens como as mulheres, durante os intervalos dos tremores, entoavam ladainhas ou atormentavam cruelmente os moribundos com cerimónias religiosas e, cada vez que a terra tremia, todos de joelhos bradavam misericórdia, com a voz mais angustiosa que imaginar se possa.» Balanço da tragédia: entre 12 a 15 mil vítimas mortais, numa população de 260 mil e mais de 10 mil edifícios destruídos. Voltaire, em Genebra, escreve impressionado Poème sur le désastre de Lisbonne.(1)
Nova burguesia e novo Chiado
Nova burguesia e novo Chiado
Cuidaram então alguns sacerdotes que a tragédia era a reacção de Deus ao absentismo das pessoas que andavam arredadas da Santa Madre Igreja. Não se tratava, portanto, de um fenómeno natural, provocado por uma qualquer falha geológica; era antes a demonstração do que podia acontecer – e aconteceu – a quem não ia à missa. A seguir à tragédia, não houve, apenas, que «enterrar os mortos e cuidar dos vivos». Foi muito complicado e moroso todo o trabalho de identificação de quem eram os verdadeiros proprietários das agora ruínas, antes casas, estabelecimentos ou palácios, porque a maior parte das pessoas não possuía registo de propriedade. O marquês de Pombal foi impiedoso com os salteadores que foram imediatamente enforcados, no local onde eram apanhados a pilhar. Erguia-se o cadafalso e era imediata a execução, para exemplo. Com o correr dos anos, bastante lentamente, as barracas improvisadas deram origem a casas sólidas já preparadas para aguentar futuras oscilações e para evitar focos de doenças. Acabava-se com os becos e charcos de águas estagnadas, alargam-se as ruas e uma rede de esgotos tornava a capital numa cidade já não medieval mas moderna. O ministro do rei D. José, Sebastião José de Carvalho e Melo, chamou o engenheiro do Reino Manuel da Maia, que formou equipa com os engenheiros militares Carlos Mardel, Elias Pope e Eugénio dos Santos e que, sem demora nem descanso, meteram mãos à obra da reconstrução de Lisboa. O rei D. José morreu em 1777. Em 1798 começou a esboçar-se o traçado de uma estrada Lisboa-Porto. (1) Não há unanimidade quanto ao número de mortos. Entre 20.000 e 100.000. Parece que o número mais aproximado terá sido de 60.000.
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