28 AGOSTO, 20:23•HASANKEYF•ZLR
(ANSA) - 10 mil anos de história com data marcada para terminar. Hasankeyf, pérola da Turquia sul-oriental, perto do Curdistão, é quase uma cidade fantasma.
Há mais de uma década, essa encantadora vila banhada pelo rio Tigre vive sob a ameaça da barragem de Ilisu, um projeto faraônico que vai deixar todo o burgo e seus monumentos debaixo d'água assim que for concluído.
Talvez seja salva apenas a ponta do minarete da mesquita de El Rizk, que data do ano 1400 e conserva as inscrições dos 99 nomes usados para chamar Alá. Por isso, visitar Hasankeyf é uma experiência para os olhos e para a alma.
Antigamente um cruzamento essencial para a rota da seda, a cidade apresenta os traços de vários povos: hititas, romanos, otomanos e, sobretudo, turcos seljúcidas. O Tigre a corta ao meio: de um lado ficam os árabes, do outro, os curdos. Um vertiginoso e espetacular desfiladeiro abriga a antiga cidadela, que hoje está fechada por não especificados "motivos de precaução", embora seja possível visitá-la pulando uma frágil cerca e ignorando a proibição.
Imersos nesse cenário e envoltos pela tênue luz refletida por essa terra seca e árida, outros monumentos resistem com dificuldade: pedreiras habitadas até poucas décadas atrás, como na Capadócia; o mausoléu de Zeynel Bey, em torno ao qual pastam cabras e ovelhas em busca de um pouco de sombra; a tumba de Abdullah Imam; e o minarete da mesquita do sultão Suleiman.
Tudo isso está destinado a terminar sob a água. Ainda não há datas certas, mas o projeto da barragem, após uma paralisação em 2008, foi retomado e já tem 80% das suas obras concluídas. Nessa região, a água é fundamental. Cerca de 100 km a oeste, a barragem de Ataturk modificou radicalmente as condições econômicas e naturais da área nos arredores de Urfa, terra de Abraão.
Os cidadãos que um dia viveram em cabanas e dormiam a céu aberto sob dosséis azuis para confundir os escorpiões, hoje podem ter modernas residências com ar condicionado. O problema é que o ecossistema da região entrou em pane, permitindo até o aparecimento da malária.
Nos últimos anos, Hasankeyf atraiu a atenção de diversas organizações e associações. Nasceram em todo o mundo petições e iniciativas para tentar salvá-la, e o governo turco propôs transferir os habitantes locais para caríssimos apartamentos em uma colina pouco distante.
A grande maioria recusou. Quem nasceu e cresceu em Hasankeyf escolheu ficar - ao menos por enquanto -, tentando desfrutar o máximo possível da repentina popularidade que está levando uma onda de turistas à cidade condenada.
Dignidade e orgulho, mas também resignação. Muitos, sem alternativa, aceitaram trabalhar para a barragem que submergirá suas próprias casas. E hoje os habitantes vivem um dia de cada vez, com a esperança de que o espírito que permitiu a Hasankeyf sobreviver a saques e dominações faça a vila superar o seu desafio mais duro em 10 mil anos de história. (ANSA)
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