AMBIEL, Valdirene do Carmo Estudos de Arqueologia Forense Aplicados aos
Remanescentes Humanos
dos Primeiros Imperadores do Brasil Depositados no Monumento à
Independência. Dissertação de
Mestrado em Arqueologia (MAE/USP. Universidade de São Paulo, São Paulo,
2013).
Orientadores: Dorath Pinto Uchôa e Astolfo G. Mello Araujo
Este projeto foi de iniciativa própria de Valdirene do Carmo Ambiel que
nasceu em 1971, próximo ao
Monumento à Independência, no bairro do Ipiranga, na cidade de São Paulo.
Valdirene, passou boa parte
de sua infância brincando na área do Monumento e Museu Paulista da
Universidade de São Paulo que hoje
é conhecida como Parque da Independência. A pesquisadora pode acompanhar
pessoalmente, a chegada
dos remanescentes humanos da Imperatriz Dona Amélia de Leuchtenberg à
Cripta (ou Capela) Imperial,
em abril de 1982.
Junto com estes eventos ela acompanhou os problemas de infiltração de água
no local e com este problema
vieram as preocupações com os efeitos que a umidade poderia produzir aos
despojos dos Imperadores:
D.Leopoldina, Dom Pedro I e D. Amélia. Em 2010 surgide no local. Pois
apesar das reformas e obras,
como a abertura do espaço museológico realizado pelo Departamento do
Patrimônio Histórico (DPH) da
Prefeitura do Município de São Paulo entre o final dos anos de 1990, início
dos anos 2000, terem diminuído
o problema de infiltração, a umidade ainda persiste no local.
Desta forma, não houve em nenhum momento uma ‘encomenda’ por parte de qualquer órgão público ou da
Família Imperial do Brasil, seja para a pesquisadora Valdirene do Carmo Ambiel, seja para Universidade de São Paulo, para que este trabalho fosse realizado.
Houve sim o apoio da Família Imperial, Departamento do Patrimônio Histórico da Prefeitura do Município de São Paulo (DPH), Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Brasileiro (IPHAN). Mas não uma solicitação formal. Muito pelo contrário, apesar destes órgãos públicos e da Família terem informações sobre o estado em que se encontrava o local, a arqueóloga passou os últimos dois anos buscando as permissões dos mesmos citados acima para a realização destes trabalhos. Toda esta preocupação por parte do DPH, IPHAN e Família Imperial é natural, por se tratar de um assunto que envolve a história e a identidade brasileira, e no caso da Família Imperial, por se tratar da história de seus antepassados. Este projeto de pesquisa de autoria de Valdirene do Carmo Ambiel se constituiu em uma dissertação de mestrado defendida pela pesquisadora no Programa de Pós-graduação em Arqueologia do MAE/USP sob orientação de Dorath Pinto Uchôa e Astolfo Gomes Mello Araujo.
Acreditamos ser de muita importância que as informações sobre os objetivos deste trabalho sejam levados ao conhecimento público e que fiquem registrados.
Os gastos com os 7 meses de trabalho na Capela Imperial do Ipiranga (23/2/2012 até 6/9/2012) foram
arcados pela pesquisadora Valdirene do Carmo Ambiel, bolsista de mestrado CAPES, e com o apoio e
colaboração do IPEN, do Grupo de Física Aplicada com Aceleradores do Instituto de Física da USP, Departamento de Patologia, Departamento de Radiologia e Serviço de Verificação de Óbitos da Capital da
Faculdade de Medicina USP, do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB/USP), da empresa Estúdio Sarasá
Conservação e Restauroalém é claro de colegas que como pessoas físicas colaboraram com seu conhecimento para o desenvolvimento deste trabalho como profissionais e cientistas, pois além das instituições citadas, houve a participação de médicos legistas e de um odontolegista e arqueólogo forense, além da troca de informações com colegas pesquisadores do tema.
Todas estas colaborações tornaram possíveis as pesquisas realizadas nos remanescentes humanos dos
Primeiros Imperadores do Brasil, fazendo deste trabalho uma pesquisa multidisciplinar. Assim, este trabalho
contou com recursos próprios sem que houvesse ônus para o DPH, IPHAN ou mesmo para Família Imperial.
- Dona Leopoldina
O início dos trabalhos na Capela Imperial foi no dia 23/2/12, com a abertura do sarcófago de granito de
D.Leopoldina pela equipe do Estúdio Sarasá e coleta de amostras de cromatografia gasosa pela equipe do
IPEN. Este procedimento foi realizado antes da abertura de todas as urnas funerárias.
No dia 27/2, houve a abertura da urna funerária com os remanescentes humanos da Imperatriz.
Vê-se, com base nestas imagens, e na decapagem arqueológica que a Imperatriz foi sepultada com o traje
de gala imperial (o único que ela possuía). Esta comparação foi feita com iconografias que mostram
D.Leopoldina usando este vestido, com manto e toucado.
Foi localizada também a faixa Imperial e um par de brincos de estrutura simples. Este material foi higienizado e acondicionado pela equipe do colaborador Valter D.Muniz e está sob a guarda do
DPH fora do Monumento à Independência. Em breve fará parte de uma exposição.
Os exames realizados nos remanescentes humanos da Imperatriz não indicam a presença de fraturas em vida. Também foram analisados, minuciosamente boletins médicos e outros documentos históricos de novembro e dezembro de 1826, época da morte da Imperatriz que aconteceu em 11 de dezembro de 1826. Este estudo foi feito pelo Prof.Dr Luiz Roberto Fontes, médico legista, ginecologista/obstetra e biólogo, que colaborou com nosso trabalho de pesquisa. Segundo o doutor Fontes,não há indícios que a causa mortis da Imperatriz tenha sido causada por algum tipo de violência física causada pelo Imperador Dom Pedro I, como algumas bibliografias que estudam o assunto sugerem. Uma vez que o Imperador partiu do Rio de Janeiro para a Cisplatina (Uruguai), em 23 de novembro de 1826. O aborto da Imperatriz aconteceu em 2 de dezembro e o óbito em 11 de dezembro. Além disso, o Dr. Fontes faz vários apontamentos sobre procedimentos aplicados na Imperatriz, que para a Medicina da época eram comuns, mas que podem ter influenciado na piora de seu quadro clinico levando ao óbito.
- D. Pedro I
Todos os procedimentos de cromatografia gasosa e também de coleta para análises fungicas foram
aplicadas também na abertura da urna de D.Pedro I. A questão é que, no caso do Imperador que foi
trasladado de Portugal para São Paulo em 1972, havia ainda as três urnas. Portanto, antes da abertura de
cada uma delas foi realizada a coleta de amostra para a cromatografia gasosa pelo IPEN.
Da mesma forma que aconteceu com D.Leopoldina a Família Imperial e seus representantes foram
chamados, assim como representantes do DPH para uma breve cerimônia religiosa, obedecendo um pedido e um direito da família.
Os remanescentes humanos de D.Pedro estavam da mesma forma que D.Leopoldina esqueletizados,
porém, o que mais chamou a atenção foi sua deposição que mostrava uma total desarticulação. A fragilidade da madeira do caixão que abrigava os despojos os obrigou a uma decapagem arqueológica antes do exame de tomografia.
Nesta decapagem observou-se a presença de três comendas portuguesas, entre elas o Tosão de Ouro. Esta comenda possui várias vertentes na Europa e pode apresentar diversas formas. Porém, em todas as vertentes, só é usada pelo soberano ou pelo herdeiro direto ao trono. Foram realizadas análises pelo Grupo de Pesquisa de Física Aplicada com Aceleradores do IF/USP. Algumas comendas foram analisadas, além da fluorescência de Raios X, feitas ‘in situ’, também pelo acelerador nuclear do Instituto de Física da USP, a técnica usada foi a PIXE (Particle Induce X-Ray). Todas estas técnicas, não destrutivas, foram aplicadas também visando à preservação dos artefatos.
Na decapagem observou-se a presença de fragmentos de costelas que mostram marcas, provavelmente feitas para a famosa retirada do coração de D. Pedro que hoje é preservado na Igreja da Lapa, na Cidade do Porto.
Não foram encontradas comendas ligadas ao Brasil. Isso porque o Imperador foi obrigado a abdicar em 1831, quando voltou para Portugal, onde enfrentou uma guerra civil contra o irmão D. Miguel para assegurar o trono de sua filha D.Maria da Glória, Rainha Maria II de Portugal. Dom Pedro queria ser lembrado, apenas como um General Português, o Duque de Bragança. Acredita-se, com base nos artefatos
encontrados, que assim foi.
- D. Amélia
O caso da Imperatriz D. Amélia de Leuchtenberg, segunda esposa de D. Pedro I também foi diferentes. Os remanescentes humanos da Imperatriz foram trasladados para o Brasil em 1982. E não havia registro no DPH onde estesestavam localizados, o que levou a buscar informações com pessoas que foram
responsáveis pelo traslado na época.
Mais de 12 horas se passaram para retirar seu esquife do nicho funerário, em que se encontrava na Capela Imperial. Apesar de o nicho ter sido feito de maneira cuidadosa, a falta de manutenção do Monumento à Independência fez com que houvesse no local uma certa presença de umidade, fazendo com que o ataúde estivesse úmido.
Da mesma forma que D. Pedro, o corpo de D. Amélia estava dentro de três urnas, uma delas de chumbo.
Os procedimentos de cromatografia gasosa foram feitos, assim como os de análises fungicas .
Localização da Comenda Tosão de Ouro, onde pode ser observada a presença de muito sedimento. Pouco acima do artefato foi evidenciado um botão da farda de D. Pedro. Foto Valter D. Muniz.
Remanescentes Humanos de D.Pedro I do Brasil ou Pedro IV de Portugal, Duque de Bragança.
Imagens Vitor Hugo Mori
A Família Imperial e representantes do DPH foram novamente chamados para cerimônia de abertura. Para a surpresa de todos os presentes, o corpo de D.Amélia está preservado , como foi observado pelas autoridades dogoverno e divulgado à imprensa na época.
Ao contrário de D. Pedro o corpo da Imperatriz foi bem preservado para o traslado, tanto pelos técnicos portugueses como pelos brasileiros não havendo, inclusive a presença de qualquer tipo de sedimentos, apenas pequenos Remanescentes Humanos de D.Pedro I do Brasil ou Pedro IV de Portugal, Duque de Bragança.
Com a autorização da Família Imperial, DPH e IPHAN o corpo foi transladado para exames usada pelo Departamento de Radiologia da FMUSP foi a Gemstone Spectral Imaging que nos proporcionou a análise em 3D dos remanescentes humanos da Imperatriz e uma visualização do material associado.
Pode-se observar detalhes do traje em que Dona Leopoldina foi sepultada.
Tomografia D. Leopoldina. Dep.de Radiologia FMUSP. Imagens captadas de filmagens, Valter D. Muniz
Fotografia
Fotografia Infravermelho. Trabalho realizado por Elizabeth Kajiya membro do Grupo de Pesquisa de
Física Aplicada com Aceleradores IF/USP.Restos de vegetais, provavelmente ainda dos funerais que ficaram impregnados no vestido. D. Amélia, após a morte de D. Pedro, em 1834, usou luto pelo resto de
sua vida, em 1873.
Dona Amélia também foi levada para o mesmo exame de tomografia a que fora submetida D. Leopoldina e D.Pedro.
Não se sabe, ainda, os motivos que levaram a preservação do corpo da Imperatriz. Porém, com a
ajuda do Serviço de Verificação de Óbitos da Capital (também ligado a FMUSP) foi aplicado o mesmo método de preservação que pode ter sido usado, não só em1873, como também em 1982, visando à preservação dos remanescentes humanos de D. Amélia, inclusive a substituição das urnas funerárias por urnas recentes.
A diferença é a substituição do chumbo pelo zinco, este foi soldado, assim como a placa de chumbo havia sido.Também foi construído outro nicho para abrigar os despojos da Imperatriz.
Estes procedimentos aplicados com os corpos e como material associado são temporários. Há necessidade
de um acompanhamento para manutenção, inclusive dos artefatos que foram higienizados e acondicionados
para exposição.Muitas amostras foram coletadas e já estão sendo analisadas por equipes do Instituto de Física USP e Faculdade de Medicina da USP e outras instituições ligadas à Universidade de São Paulo, ou a universidades brasileiras, mantendo o caráter muldisciplinar do trabalho.
Análises que fazem parte do doutoramento de Valdirene do Carmo Ambiel autora e arqueóloga responsável pelo projeto.
Porém, a própria arqueóloga alerta: “É necessário que haja um trabalho de restauração urgente no
Monumento à Independência. Um projeto montado por arquitetos e engenheiros civis foi apresentado ao DPH da Prefeitura do Município de São Paulo, como parte dos trabalhos de pesquisa arqueológicas realizadosno local em 2012. A situação do local está próxima aoestado crítico
O ataúde de mais de 300 kg da Imperatriz D.Amélia é retirado do nicho localizado na parede da Cripta Imperial do Monumento à Independência
MAE/USP - Museu de Arqueologia e Etnologia - Universidade de São
Paulo
Colaboração Paulo Marcelo Rezzutti